Temor de uma possível escalada do conflito na região esconde um ado de alianças e colaboração, cuja ruptura ocorreu com a revolução islâmica de 1979
Pessoas se reúnem para um protesto contra a onda de ataques israelenses contra o Irã no centro de Teerã, em 13 de junho de 2025 (ATTA KENARE / AFP)

Pessoas se reúnem para um protesto contra a onda de ataques israelenses contra o Irã no centro de Teerã, em 13 de junho de 2025 (ATTA KENARE / AFP)

Agência o Globo
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Publicado em 13 de junho de 2025 às 08h17.

Última atualização em 13 de junho de 2025 às 08h26.

O governo israelense lançou na quinta-feira, 12, o que chamou de "ataques preventivos" contra o Irã, em meio ao acirramento das tensões no Oriente Médio, e alertou sua população para o risco iminente de uma retaliação com "mísseis e drones" vindos do território iraniano.

Segundo Israel, o alvo da operação intitulada "Nação de Leões" é o programa nuclear do Irã, além de instalações ligadas ao programa de mísseis balísticos. A imprensa local afirma que os chefes do Estado-Maior das Forças Armadas e da Guarda Revolucionária, além de cientistas nucleares, teriam sido mortos.

Em pronunciamento, o premier israelense, Benjamin Netanyahu disse que um dos alvos era a "instalação de enriquecimento nuclear em Natanz", que foi alvo de ações de sabotagem atribuídas a Israel no ado, assim como os "principais cientistas nucleares iranianos".

A imprensa iraniana afirmou que o chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, Mohammad Bagheri, teria morrido na etapa inicial dos ataques, além de ao menos dois cientistas nucleares, Mohammad Mahdi Tehranchi e Fereydoon Abbasi. A TV estatal confirmou ainda a morte de parte dos metade dos integrantes da cúpula da Guarda Revolucionária, incluindo o comandante-chefe, Hossein Salami, que ocupava o posto desde 2019. Um golpe que analistas veem como elemento-chave para que a resposta iraniana use todas as forças à disposição do regime. A TV Nour News, ligada ao regime, afirma que o líder supremo, aiatolá Ali Khamenei, está em um local seguro, mas um de seus assessores ficou gravemente ferido.

Em abril do ano ado, ocorreu a primeira troca de ataques diretos da História entre os dois inimigos, fruto de uma retaliação de Teerã a um ataque israelense à embaixada iraniana na Síria. Mais tarde, em outubro, um novo episódio ocorreu, ainda mais intenso, acendendo o alerta de uma possível guerra mais ampla no Oriente Médio — que acabou não se concretizando.

A possível escalada do conflito na região — já tensionada pela guerra entre Israel e Hamas na Faixa de Gaza, iniciada em 7 de outubro de 2023 — esconde um ado de alianças e colaboração, cuja ruptura ocorre com a revolução islâmica de 1979. Desde então, uma guerra fria tem sido travada entre os países, com ameaças e ataques ocorrendo indiretamente através de outros atores e países. Entenda como a mudança ocorreu:

Da colaboração à ruptura

Dois anos após a criação do Estado de Israel, o Irã se tornou em 1950 o segundo país muçulmano a reconhecer o novo país, atrás apenas da Turquia. Na época, Teerã abrigava a maior comunidade judaica do Oriente Médio.

Naquela época, Israel mantinha uma importante missão diplomática no Irã e importava 40% de suas necessidades de petróleo do país em troca de armas, tecnologia e produtos agrícolas. A colaboração era tão estreita que a temida polícia secreta iraniana, o Savak, foi criada em 1957 com a ajuda da Agência Central de Inteligência (CIA) americana, depois do Mossad israelense.

Em 1979, a República Islâmica é instaurada com a queda do xá Mohammad Reza Pahlavi, apoiado pelos Estados Unidos, e o retorno do líder revolucionário e aiatolá Ruhollah Khomeini. O Irã cortou todas as suas relações oficiais com Israel, deixando de reconhecê-lo, embora os laços comerciais informais tenham permanecido. Um ano depois, a Jihad Islâmica, de inspiração iraniana, tornou-se a primeira organização palestina islâmica a pegar em armas contra o Estado judeu.

Apesar da animosidade, Israel chegou a entregar mísseis a Teerã durante a guerra Irã-Iraque (1980-88). A operação foi revelada no caso da venda de armas americanas ao Irã (Irangate), uma manobra destinada a obter a libertação de reféns americanos mantidos no Líbano.

Hezbollah, braço armado do Irã

Em 1982, Israel invade o Líbano para pôr fim aos ataques palestinos do país vizinho, então em plena guerra civil. A Guarda Revolucionária ajudou então a criar o Hezbollah, um movimento xiita que se implantou no sul libanês e lançou uma luta armada contra o Estado judeu.

Israel, desde então, acusa o Irã e o Hezbollah de estarem envolvidos em numerosos ataques contra interesses israelenses ou judeus no exterior.

Irã se arma e preocupa Israel

Em 1998, o Irã disse ter testado pela primeira vez o míssil terra-terra Shahab-3, com um alcance de 1.300 km e capaz de atingir Israel, e a tensão entre os países foi intensificada com a eleição de Mahmud Ahmadinejad, em 2005: o presidente ultraconservador defendeu em várias ocasiões o desaparecimento de Israel e chamou o Holocausto, extermínio de judeus durante a Segunda Guerra Mundial (1939-45), de "mito". Naquele mesmo ano, Teerã retomou suas atividades de enriquecimento de urânio em Isfahan.

Dez anos depois, em julho de 2015, foi firmado um Plano de Ação Conjunto Global (JOA, na sigla em inglês) que estabelecia limites ao programa nuclear iraniano, que Teerã alega ser pacífico. O acordo, que oferecia alívio das sanções econômicas em troca do comprometimento das autoridades iranianas, foi assinado pela Rússia, China, Alemanha, Reino Unido, França e pelos EUA, na época governado por Barack Obama, além do Irã.

"Israel não está vinculado a esse acordo [...] porque o Irã continua querendo nossa destruição", alertou na época o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, que insiste que o objetivo iraniano é a bomba atômica.

Tel Aviv, uma potência nuclear não declarada, apoiou os Estados Unidos quando o país anunciou em maio de 2018, sob as ordens do presidente Donald Trump, sua retirada do acordo com o Irã, uma promessa de campanha. Na época, o republicano alegou, sem dar provas, que, mesmo com o acordo, Teerã continuou construindo armas nucleares.

Síria, cenário de confronto

A partir de 2013, e com a Síria em guerra civil, Israel viu com maus olhos a intervenção militar do Hezbollah e de Teerã para apoiar o regime de Bashar al-Assad. Tel Aviv, então, realiza centenas de ataques contra seu vizinho sírio, visando tropas do governo, forças iranianas e combatentes do Hezbollah.

Aliança contra o Irã

Em novembro de 2017, Netanyahu menciona a "cooperação frutífera" e "secreta" de Israel com países árabes, em um contexto de preocupação com a crescente influência do Irã no Oriente Médio. Três anos depois, em setembro de 2020, os Emirados Árabes Unidos e o Bahrein, unidos por sua animosidade em relação ao Irã, assinam acordos de normalização das relações com Israel.

Ataques

Nos meses seguintes, Israel acusou o Irã de atacar navios, que por sua vez acusou o Estado judeu de ass engenheiros e sabotar a fábrica de enriquecimento de urânio de Natanz, no centro do país.

Os ataques atribuídos a Israel contra alvos iranianos na Síria também se multiplicaram, e foram registradas as mortes de um coronel (novembro de 2022) e depois um comandante (dezembro de 2023) da Guarda Revolucionária. Mas é em 1º de abril que a guerra, que até então ocorria por debaixo dos panos, é elevada a outro patamar.

Um ataque atribuído a Israel destruiu o consulado iraniano em Damasco, capital da Síria, e, segundo a ONG Observatório Sírio dos Direitos Humanos (OSDH), causou 16 mortes, incluindo dois generais da Guarda. Teerã prometeu "punir o regime maligno" e, na madrugada de domingo, lançou um ataque com mísseis e drones — pela primeira vez na História — a partir de seu território.

Segundo o porta-voz militar Daniel Hagari, a República Islâmica lançou "mais de 300 drones e mísseis" contra o Estado judeu, mas o Exército israelense afirmou ter conseguido "frustrar" o ataque ao interceptar 99% dos drones e mísseis lançados. Israel prometeu uma resposta.

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